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Crítica: ‘Resident Evil 6: O Capítulo Final’ é pílula amarga contra T-Virus
Tudo indica que 2017 pode ser um grande ano para a franquia Resident Evil. Nos games, a Capcom liberou o sétimo episódio da série com uma verdadeira volta às raízes, bebendo nas águas de títulos como “Evil Dead”, “O Massacre da Serra Elétrica” e tantos outros clássicos do terror para apresentar uma trama tensa e um novo estilo de jogatina. Nos cinemas, temos a estreia da aventura derradeira de Alice (Milla Jovovich) na forma de “Resident Evil 6: O Capítulo Final”, que chega aos cinemas brasileiros na próxima quinta-feira (26).
Como o capítulo anterior da saga, “Resident Evil 5: Retribuição”, foi lançado em setembro de 2012, a espera para que o novo filme saísse do papel e ganhasse as telonas foi de quase quatro anos e meio. Diversos motivos contribuíram para o atraso no cronograma do longa-metragem que fecha a série. O principal deles, claro, foi a gravidez da atriz principal, que fez com que as filmagens inicialmente programadas para agosto de 2014 passassem para o mesmo mês do ano seguinte.
Quando as câmeras finalmente começaram a rodar, houve uma sequência de acidentes bem infelizes. Em primeiro lugar, a dublê de Jovovich, Olivia Jackson, acabou se machucando gravemente ao bater de moto em uma grua durante a gravação de uma cena de perseguição. Ela ficou em coma por duas semanas e sofreu uma série de lesões bem sérias, incluindo o rompimento de nervos na coluna cervical e a amputação de seu braço esquerdo. Outro membro da produção morreu ao ser esmagado por um dos carros que faziam parte do set.
A própria produção desse capítulo final foi meio que uma aventura cinematográfica por si só
Para finalizar, em dezembro de 2015, pouco depois de as filmagens acabarem, vazou na internet um roteiro bem detalhado da trama. Na postagem feita no IMDB – e apagada tempos depois –, um internauta destrinchou boa parte do que, supostamente, viria a ser “Resident Evil 6”. Ufa! Como dá para perceber, a própria produção desse capítulo final foi meio que uma aventura cinematográfica por si só. Porém, será que todo o trabalho, suor e sangue valeu a pena? Conferimos o longa-metragem na última terça-feira (24) e contamos tudo para você!
Na lata
A resposta curta para a pergunta mais acima é: “Resident Evil 6: O Capítulo Final” é um filme ruim. Muito ruim. Calma, não precisa sair correndo para xingar muito nos comentários ou no Twitter: isso não quer dizer que o sexto episódio da franquia é o pior longa-metragem feito na história de Hollywood ou qualquer coisa do tipo. A produção até tem os seus momentos, mas há diversos fatores para que o fechamento da saga fique aquém do que se esperava – mesmo para quem, como eu, curte o estilão despojado da série.
Claro que não é justo avaliar tecnicamente ou mesmo com muito rigor qualquer uma das encarnações de Resident Evil nos cinemas ou ainda compará-las com produtos mais sofisticados da categoria. Afinal, ao pagar o ingresso para assistir a uma das criações de Paul W. S. Anderson, ninguém espera ver um material que vai concorrer ao Oscar ou ao Globo de Ouro. A ideia, no final das contas, é desligar o cérebro e mergulhar em uma aventura recheada de ação, explosões, tiros e muito sangue em tela, certo?
Não faltam movimentos estilosos de Alice no filme
Resident Evil 6 conta com um roteiro bem enxuto para guiar o público
“Resident Evil 6”, como seus antecessores, segue essa fórmula com exatidão e, assim como eles, conta com um roteiro bem enxuto para guiar o público. A trama é incrivelmente simples: pouco tempo depois dos acontecimentos de “Resident Evil 5: Retribuição”, Alice se encontra sozinha nos escombros de Washington, figurando como a única sobrevivente da emboscada arquitetada por Wesker (Shawn Roberts). Em suas andanças pela cidade, a protagonista acaba se deparando com ninguém menos que a Rainha Vermelha (Ever Gabo Anderson).
A projeção da inteligência artificial criada pela Umbrella se revela um aliado inesperado e explica para a moça que ela precisa seguir rapidamente para Raccoon City se quiser salvar os últimos focos de resistência da humanidade na Terra. A partir desse momento, a combatente engata uma corrida contra o tempo para conseguir o antídoto definitivo contra o T-Virus, encontrando alguns velhos amigos – e inimigos – no caminho e voltando ao local onde toda a saga começou: a base secreta conhecida como a Colmeia.
Recapitulação e... velocidade máxima!
Essa simplicidade na linha condutora do filme, no entanto, logo se revela uma de suas grandes fraquezas. A produção até começa bem, trazendo uma verdadeira retrospectiva de toda a franquia ao contar os principais acontecimentos de cada capítulo, além de oferecer algumas dicas da verdadeira motivação por trás da criação mais mortal desenvolvida nos laboratórios da Umbrella. O resumão serve tanto para que os veteranos relembrem os 15 anos da série quanto para que marinheiros de primeira viagem se localizem no meio dessa longa história.
Caso queira ir mais preparado ao cinema e esteja sem tempo de fazer uma maratona dos últimos cinco longas-metragens, uma dica é assistir ao clipe abaixo, no qual Jovovich discorre de maneira bem-humorada sobre como Resident Evil chegou ao seu momento derradeiro. Seja como for, o problema é que, passada essa calorosa viagem ao passado, “Resident Evil 6” se embanana em praticamente todas as suas tentativas de empolgar ou amarrar as dezenas de pontas soltas deixadas ao longo da última década e meia.
Todo o primeiro terço do filme, por exemplo, é composto de sequências de ação para lá de exageradas. De nenhum modo isso seria um ponto fraco em um filme como esse, mas falta muita cadência à montagem, com a sensação de que cada uma das cenas é muito “seca” e sem propósito em relação ao todo. A câmera “nervosa” – que corta, balança e se movimenta a todo momento para tentar valorizar as trocas de sopapos –, a trilha sonora ligada no 220v constantemente e os frequentes jump scares não ajudam muito nessa introdução.
Se tudo é épico, nada é épico
A impressão é que o filme quer ser épico a cada segundo e acaba caindo naquela velha máxima de que, se tudo é épico, nada é épico. Se você já assistiu a produções como “Mad Max: Estrada da Fúria”, sabe como é importante haver um respiro entre as cenas de ação desenfreada para que o público consiga digerir o que foi mostrado antes de partir para a próxima luta, briga ou perseguição insana. Aqui, pelo contrário, só há silêncio quando o longa se prepara para aumentar o volume para dar um susto ou ampliar o impacto de uma situação.
Roteiro? Que roteiro?
O ponto mais baixo de “Resident Evil 6: O Capítulo Final” é o seu segundo ato, que sofre com uma inconsistência tremenda em praticamente todos os sentidos. Ao chegar aos arredores de Raccoon City e se reencontrar com Claire (Ali Larter), Alice embarca em uma subtrama completamente dispensável e que só serve como uma ferramenta bem artificial para prolongar a história e atrasar o cronograma apertado da personagem – que tem algumas poucas horas para salvar a humanidade.
Some a isso personagens novos que não empolgam – no nível “bucha de canhão” –, decisões bastante duvidosas por parte dos heróis e alguns mortos-vivos que parecem ter saído das piores sequências em computação gráfica de “Guerra Mundial Z” e você tem em mãos a receita para perder o fio da meada e, por consequência, o interesse do espectador. Além disso, o ritmo nesse ponto é ainda mais fraco que o da primeira parte, parecendo que a edição foi feita e refeita até render uma colcha de retalhos meio desconexa como em “Esquadrão Suicida”.
A trama segue em um ritmo bastante inconstante
Felizmente, na porção derradeira do filme, as coisas aceleram um pouco mais e a aventura ganha um fôlego que não demonstrava até então. Ok, algumas armadilhas manjadas à la “Jogos Mortais” pipocam aqui e ali, mas, no geral, o retorno à Colmeia deve derreter o coração de qualquer fã de longa data – tanto pelo cenário familiar quanto pelo fato de a trama voltar às suas origens. Adicionalmente, algumas boas tiradas, duas ou três cenas de impacto e uma luta final que traz sua própria dose de surpresas completam bem o pacote.
Resident Evil 6 sofre para manter as engrenagens em movimento
Com toda essa variação de qualidade em cada um dos atos, fica fácil perceber que “Resident Evil 6” sofre para manter as engrenagens em movimento. Embora os outros episódios da saga também recorram a um enredo raso para apresentar a aventura da vez de Alice, eles utilizam esse artifício de forma bem consciente e competente, fazendo com que o show de tiros e explosões flua divertidamente nas telonas – sim, isso vale mesmo para o quinto episódio da série, “Retribuição”, que ainda divide opiniões.
Na nova produção, o roteiro mal consegue fazer esse trabalho de forma satisfatória, o que indica problemas na trajetória de uma equipe já calejada na arte de produzir Resident Evils. Uma explicação para essa escorregada em um elemento básico do filme pode ser realmente o vazamento do script na web há alguns anos. Conferindo o produto final, dá para perceber que muito da trama estava no material vazado e que, provavelmente, fizeram mudanças de última hora para que eles não tivessem que voltar à estaca zero. Uma pena!
E mesmo assim, você vai assistir!
Pode parecer estranho, mas, mesmo com todos esses defeitos, “Resident Evil 6: O Capítulo Final” é um filme obrigatório para qualquer um que acompanhe há mais de uma década a franquia nos cinemas. Em uma indústria que ainda luta para conseguir emplacar bons filmes baseados em games, mesmo quando se trata de parcerias de grandes nomes de ambos os setores – vide os recentes “Warcraft” e “Assassin’s Creed” –, a série capitaneada por Paul W. S. Anderson chega ao seu sexto episódio colecionando bilheterias de dar inveja.
O roteirista e diretor percebeu cedo que a decisão de não se prender ao material original e a liberdade de poder criar a sua própria mitologia, em cima de uma nova personagem, foi essencial para o sucesso da saga – sempre com a inclusão de pitadas certeiras de elementos dos próprios jogos, claro. Com isso, fica muito, muito difícil não querer saber como tudo termina e colocar um ponto-final em uma daquelas histórias que são um guilty pleasure de muita gente por aí – no mesmo nível de produções como “Transformers” e “Velozes e Furiosos”.
Quem aí assistiu aos outros cinco filmes e vai deixar passar esse, hein?
A amarração final está longe de ser perfeita, ocorre meio que às pressas e dá uma forçada na barra em algumas das conclusões, porém não deixa de ser um descanso merecido para todos envolvidos no projeto: diretores, atores e público. Há até mesmo uma deixa para que, caso a produtora precise encher seus cofres com um tiro certeiro, uma sequência ou um reboot possam ser garantidos sem muita dificuldade. Afinal, estamos falando de Hollywood, não é mesmo?
Se partirmos do princípio de que até o game se reinventou depois de tanto tempo no mercado, não é de se estranhar que isso possa acontecer em sua contraparte hollywoodiana. Por falar nisso, Resident Evil VII: Biohazard também ganhou destaque no evento do longa-metragem. Além de a Capcom disponibilizar estações do jogo para que os visitantes o curtissem com o PlayStation VR, um trailer de RE7 exibido antes do filme mostrou que o clima tenso pode casar muito bem com a telona. Será que é o caminho para um novo começo? Não custa torcer.
No escurinho e em realidade virtual? Essa é a receita certa para sentir o clima de Resident Evil VII
Um adeus difícil
Por conta de todo o clima de despedida, fez falta uma presença mais massiva de personagens que marcaram a série nesse episódio derradeiro – principalmente pelo fato de boa parte deles ter dado as caras em “Resident Evil 5: Retribuição”. Ainda assim, não deixa de ser bacana ver Milla Jovovich encarnando Alice pela última vez, Ali Larter fazendo um bom trabalho na pele de Claire, Shawn Roberts sendo um Wesker ainda mais canastrão e Iain Glen se desdobrando para mostrar diferentes facetas do doutor Alexander Isaacs.
Uma grata surpresa na leva de novos artistas em “Resident Evil 6” – que são em sua maioria completamente esquecíveis – é a nova atriz-mirim a se tornar a Rainha Vermelha. A inteligência virtual maquiavélica já tinha mudado de rosto no capítulo anterior – trocando Michaela Dicker, do primeiro filme, por Megan Charpentier – e agora ganha um visual bem mais fofinho na interpretação de Ever Gabo Anderson, filha de Jovovich e Anderson. A mudança pode parecer gratuita de início, mas, por incrível que pareça, acaba se justificando.
Rostos novos e antigos fazem parte do último filme da série
No fim, “Resident Evil 6: O Capítulo Final” é um filme que, mesmo a trancos e barrancos, encerra uma franquia de sucesso nos cinemas e traz lampejos daquela aventura descerebrada que todo mundo odeia gostar – ou ama odiar. Ele está, sim, em um patamar abaixo dos capítulos anteriores, tem um roteiro praticamente inexistente e apresenta um ritmo sofrível, mas isso não deve impedir que ninguém encontre a sua diversão no longa.
Fonte: Resident Evil