Prof. Naldo
Francinaldo de Sousa Bezerra. Graduado em História pela Universidade Federal do Piauí (UFPI). Pós-graduado em História do Brasil e professor da rede estadual de ensino no Piauí e Maranhão. Produtor de eventos, crítico político e cultural.
Professor: A personagem trágica da pós-modernidade
Com muito pesar tenho que admitir que vejo o professor contemporâneo como a personagem trágica da Pós-modernidade. Por quê? Porque é a profissão que mais é afetada pelos impulsos das transformações em curso.
Tudo que possa existir em termos de deslocamento, fluidez, afrouxamento, descrença pública na ciência, bem como o esvaziamento de sentido, passam pela sala de aula. Não só isso, também o status dessa profissão não encontra mais referência estáveis, tão pouco positivadas.
O (a) professor (a) é um tipo de profissional cujas responsabilidades e cobranças são multiplicadas constantemente, mas sem um correlato reconhecimento dos seus serviços, sem que haja uma justa remuneração pelo que lhe é cobrado.
Para ser professor atualmente o pretendente tem que ter acumulado um número considerável de títulos que, trocando em miúdo, implica anos e anos de cursos de graduação e pós-graduação. Isto é, muito tempo de vida só para se formar. São 10 anos, no mínimo, para obter o doutorado. Outras profissões com menor grau de exigência intelectual recebem muito mais. Será que vale a pena ir ocupar esse lugar de miséria do professor?
O professor, no exercício de sua docência, tem que, obrigatoriamente, pesquisar, participar de seminários, congressos, simpósios, estudar, fazer extensão, fazer curso de formação continuada, produzir e publicar artigos etc. Além disso, como se fosse pouco, ainda tem que fazer todos os serviços que outrora eram realizados pelos auxiliares da secretaria.
A informatização ou automação transferiu mais responsabilidades para o professor, que tem o dever de cuidar das cadernetas eletrônicas (sistema pedagógico automatizado): digitar nota, digitar falta, digitar conteúdo, digitar plano de aula, digitar prova, digitar agenda, produzir aula em PowerPoint, digitar texto para transparência etc. É comum o professor levar equipamento próprio para a sala de aula ou para o trabalho de campo.
Essa carga de tarefas traz sofrimentos e desgastes sem nenhum retorno como reconhecimento, respeito e ganho financeiro justo. É uma indignidade a remuneração de um professor se comparada a outras categorias profissionais.
O professor tem sido, no seu ambiente de trabalho, reduzido e destinado a uma posição secundária. Onde as relações sociais, típicas da profissão, estão assumindo formas estranhas e desfiguradas, sem que ele possa incidir sobre o curso das ações como sujeito, como produto e produtor do processo.
O docente acaba figurando apenas como “produto”. Pois ele é tragicamente arrastado e lançado nas convulsões da incerteza, das perdas de referências, na fluidez dos valores. Diante de qualquer crise educacional o professor é lançado como o culpado e, como tal, tem que ser punido! O grande e único responsável pela tragédia na educação é sempre o professor!
As mãos do poder político e as mãos do mercado o aprisionam em uma pedra para que seja imolado pelos experimentalismos e pela exigência de produtividade. Os alunos, os pais dos alunos e os pedagogos ajudam acorrentar tragicamente esse ser. Pois, pais e pedagogos querem que ele seja deus e que tudo possa fazer, que tudo possa saber e solucionar.
O pedagogo acha que sempre tem uma técnica, um recurso a ser aplicado: o que falta é o professor adquirir novas habilidades e competências. Portanto, é só ele ser mais educador e tudo estará resolvido. Os pais querem que o professor, além do seu ofício, assuma as responsabilidades dos pais para seus filhos passem magicamente à condição de pessoas maravilhosas somente com o conteúdo das aulas. Como se as escolas fossem capazes de substituir as famílias.
Diante dos olhos desses cobradores o professor acaba sendo desumanizado. Como deus ou ser bestial, isto é, acima da condição humana ou bem abaixo dela. Não raro, também é fantasiado enquanto mágico.
O professor só não é percebido em sua condição humana e de cidadão, que o exercício profissional necessita de garantias mínimas de dignidade: salários, condições de trabalho, recursos etc.
Aos críticos e agentes estatais perceberem que ensino e aprendizagem implicam em relações sociais e disposições de poder, pois os sujeitos envolvidos (professor, alunos etc.) são portadores de vontades, interesses, limitações, projetos etc. que muitas vezes geram conflitos, dissensões e tensões. Ninguém ensina nada a quem não quer aprender.
O exercício profissional minimamente digno implica proteger o profissional de humilhações psicológicas, materiais e simbólicas. Essa proteção simplesmente não existe e cada vez mais professores são agredidos e executados por pais de alunos ou por alunos ou por outros...
Reconhecer que educação integral não se realiza só com aulas nas escolas é reconhecer que vários são os responsáveis pela educação do ser humano e não só os professores.
Docência é profissão e deve ser tratada igualmente em deveres e direitos, respeitando as especificidades decorrentes desse exercício profissional. O discurso que diz, repetida vezes, que ser professor é uma devoção, doação… é hipócrita e demagógico. Quem vai sustentar e manter a família do professor? Como o professor vai ser competente sem ter como investir no seu aperfeiçoamento?
Arrumem outro culpado! Professor não é mágico!
Fonte: De Francisco Araújo, Sociólogo.