Mundo
Crise na Ucrânia: "ganhar a guerra antes da guerra", a estratégia russa
Na Ucrânia, "uma guerra pode estourar a qualquer momento", adverte Washington. Segundo a Casa Branca, uma invasão poderia até começar durante as Olimpíadas de Pequim. O acúmulo de forças russas em torno da Ucrânia se encontra em uma escala sem precedentes desde o fim da Guerra Fria. Durante uma entrevista coletiva com o chanceler alemão Olaf Scholz, o presidente ucraniano disse nesta segunda-feira (14) que a adesão da Ucrânia à Otan "garantiria sua segurança".
Por Franck Alexandre
130.000 soldados russos estão concentrados ao longo da fronteira com a Ucrânia. E, desde quinta-feira (10), essas unidades estão manobrando como parte de um exercício chamado Zapad, uma reedição de um treinamento que já ocorreu em setembro de 2021.
No terreno, estão presentes 2/3 dos batalhões táticos à disposição do exército de Putin. Tanto que quase não há soldados no Extremo Oriente russo. E essas tropas são bem treinadas, explica Elie Tenenbaum, diretor do Centro de Estudos de Segurança do Ifri.
“São batalhões ou infantaria predominantemente motorizada ou cavalaria predominantemente blindada, com tanques incluindo o T72. Cada vez com cerca de 40 veículos por batalhão. Eles são apoiados por artilharia orgânica integrada e, portanto, esses batalhões devem ser relativamente independentes dentro de uma certa profundidade do campo de batalha”, avalia.
Mísseis Iskander
A isso deve-se acrescentar as capacidades de artilharia de longo alcance, incluindo mísseis balísticos Iskander, 15 batalhões de pára-quedas e forças navais significativas na Crimeia.
Há poucos dias, seis navios anfíbios se juntaram à frota do Mar Negro, aumentando a ameaça de um desembarque nas costas ucranianas do Mar de Azov com a cidade estratégica de Mariupol como objetivo.
Assim, adverte Elie Tenenbaum, Moscou está disponibilizando os meios para uma invasão em grande escala, possivelmente com quatro frentes na Ucrânia: “Um eixo realmente ao norte, em torno da cidade de Yelnia e Klimovo. Uma abordagem do nordeste que vem principalmente do Exército russo com forças locais que foram reforçadas a partir de Kursk. Então temos uma abordagem do sul e da Crimeia, é claro, o Oitavo Exército, que também foi consideravelmente reforçado. E a isso devemos acrescentar a quarta frente, que é a frente bielorrussa, com cerca de quinze batalhões de armas combinadas, 'Grupos de Batalha' que foram implantados como parte dos exercícios Zapad”, afirma.
A Rússia também poderia agir "por procuração"
Em outro cenário, a Rússia poderia desistir de uma ofensiva e preferir agir "por procuração" com "proxies" paramilitares como os da polêmica empresa Wagner. Soldados mercenarios para confundir o terreno, evitar uma guerra cara e afastar o espectro das sanções ocidentais.
"Uma guerra silenciosa, de certa forma, uma estratégia defendida pelo Kremlin", garante Dimitri Minic, pesquisador do centro russo NEI em Ifri.
“O objetivo de Moscou na Ucrânia não é inicialmente se engajar em uma luta armada interestadual, mas fazer tudo para que todos acreditem nela e assim alcancem seus objetivos políticos", diz o especialista. "O uso de forças paramilitares e até forças especiais equipadas com uniformes neutros são meios preferidos pelos teóricos militares russos. Isso lhes permite negar a presença da Rússia em certos teatros de operação. O próprio conceito de guerra foi alterado pelo exército russo", considera.
"É uma verdadeira reflexão teórica que vem sendo travada há 30 anos e ecoa as recentes declarações do general francês Thierry Burkhard, chefe do Estado-Maior das Forças Armadas da França, que recentemente evocou a importância de vencer a guerra antes da guerra. Na verdade, esta é uma área em que os estrategistas russos pensaram muito e na qual assumiram a liderança”, declarou o pesquisador.
A diplomacia ucraniana entendeu bem a mensagem enviada, estimando nos últimos dias que era “importante não entrar em pânico diante da ameaça de uma invasão russa”. O pânico e o nevoeiro da guerra são o melhor trunfo de Moscou para se infiltrar nos paramilitares em solo ucraniano.
Fonte: RFI