Política
Bolsonaro volta a criticar Barroso por causa de sistema eleitoral
O presidente Jair Bolsonaro (PL) voltou a criticar neste domingo (3.jul.2022) o ministro Roberto Barroso, ex-presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), por causa de supostas irregularidades no sistema digital de votação.
Bolsonaro divulgou um vídeo, acompanhado de um texto, em seus grupos no aplicativo de mensagens WhatsApp. O material questiona a contagem de votos e sugere que o TSE não aceita uma “apuração simultânea” feita pelas Forças Armadas porque há irregularidades no processo de totalização.
No vídeo, Barroso e Giuseppe Dutra Janino, então secretário de tecnologia da informação do TSE, respondem a uma pergunta feita por um jornalista.
Os representantes da Corte foram questionados sobre a manutenção do computador usado para fazer a totalização dos votos nas eleições. Apesar de ter aproximadamente o tamanho de uma geladeira, o equipamento foi batizado de “supercomputador” e fica na sala-cofre do TSE, em Brasília.
Ao responder ao jornalista, o técnico do TSE diz que o computador “faz um papel de nuvem computacional”. A afirmação foi usada no texto encaminhado por Bolsonaro para sugerir que a apuração é feita por um serviço de nuvem terceirizado, e não por um computador físico. O armazenamento em nuvem é um modelo usado para salvar dados na internet
O Poder360 teve acesso à mensagem divulgada pelo presidente. “Seria por isso que o TSE não aceita a apuração simultânea proposta pelas Forças Armadas? Os números poderiam ser diferentes dos votados na urna? Seria só para presidente? Ou também para governadores, deputados e senadores?”, diz um trecho.
O vídeo que acompanha o texto começou a circular no TikTok no final de junho deste ano. Segundo o TSE, é falso que a totalização de votos é feita “por um serviço de nuvem e não por um computador físico”.
A resposta do Tribunal foi publicada na página “Fato ou Boato”, rede de checagem criada pelo TSE em 2020. Clique aqui para ler a íntegra do posicionamento da Corte.
A postagem afirma que o TSE usa o sistema “Cloud at Customer” para fazer a apuração dos votos. O serviço é fornecido pela empresa norte-americana Oracle. “O TSE e os 27 TREs [Tribunais Regionais Eleitorais] utilizam o sistema de banco de dados Oracle há mais de uma década, e os serviços da Oracle foram contratados em todas as eleições que utilizaram o sistema de votação eletrônica desde 1996”, disse a Corte.
As contratações são feitas periodicamente. Nas eleições de 2020, por exemplo, a contratação da Oracle foi fechada 1 ano antes, em 2019. O TSE já enfrentou problemas por causa do sistema em 2020. Saiba mais ao final desta reportagem.
“A contratação do serviço ‘Cloud at Customer’ consiste na cessão pela Oracle, por quatro anos, de dois computadores (um principal e um redundante, para ser usado em caso de falhas)”, disse o TSE.
Segundo o Tribunal, a centralização de votos passou por “análise de diversos setores técnicos dentro do TSE para coleta de pareceres e análises jurídica”.
Eis a íntegra da mensagem encaminhada por Bolsonaro a apoiadores:
“Barroso afirmou em vídeo (acima) que: ‘quem conta os votos por ocasião das eleições é um ‘supercomputador’ de uma empresa terceirizada, contratada pelo TSE.
“Essa mesma empresa terceirizada foi a que apagou os LOGs por ocasião das eleições/2018, confirmado pelo Inquérito Policial 1361/2018-SR/PF/DF, sem classificação sigilosa
“Seria por isso que o TSE não aceita a apuração simultânea proposta pelas Forças Armadas? Os números poderiam ser diferentes dos votados na urna? Seria só para presidente? Ou também para governadores, deputados e senadores?
“Por que o TSE confia tanto no desacreditado DataFolha? Acaso os números do DataFolha estariam de acordo com os já existentes no ‘supercomputador’, que seriam mostrados no dia 02/outubro/2022?
“Por que Barroso tem andado pelo mundo dizendo que o nosso sistema eleitoral é confiável? Por que Fachin se reuniu com 70 embaixadores e pediu-lhes que, seus respectivos Chefes de Estado, reconheçam imediatamente o resultado das eleições?”.
Oracle
Na eleição de 2020, citada por Bolsonaro em críticas anteriores feitas ao TSE, o processo de apuração e divulgação dos resultados teve atraso por causa de falhas cometidas pela Oracle.
Até hoje, o que se sabe sobre o atraso da divulgação dos resultados é que foi um problema técnico causado por demora no suporte da Oracle ao TSE.
A pane enfrentada na apuração de 15 de novembro de 2020 (a eleição foi em novembro daquele ano, e não em outubro, por causa da pandemia de coronavírus) foi creditada, em parte, à Oracle.
A empresa de processamento de dados havia sido contratada pela Justiça Eleitoral para fornecer infraestrutura necessária para a contagem de votos. Quando o equipamento falhou, a Oracle não forneceu o suporte imediato para resolver o problema. Aí, houve atraso.
O processamento dos dados em 2020 foi feito com o uso de um equipamento instalado na sede do TSE, em Brasília. Além da máquina, a Oracle vendeu ao TSE um serviço chamado de “Exadata Cloud at Customer Infrastructure”. O contrato custou R$ 26,24 milhões e foi realizado com dispensa de licitação, como consta no Diário Oficial da União.
O Poder360 apurou em novembro de 2020 que a máquina da Oracle tem o tamanho aproximado ao de uma geladeira. Em nada se parece com o “supercomputador” anunciado por Roberto Barroso.
O atraso na divulgação dos resultados foi causado especificamente porque 1 dos 8 núcleos de processamento da máquina queimou. No dia seguinte ao da eleição, uma 2ª feira (16.nov.2020), o problema persistia. Mesmo depois de passadas 24 horas de a pane ter sido detectada, a Oracle ainda não havia realizado a manutenção no equipamento.
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL
Segundo disse o TSE ao Poder360 à época, a máquina da Oracle foi se adaptando quando um de seus núcleos queimou. O equipamento passou a usar algo parecido a inteligência artificial e seguiu processando os dados. A consequência foi a lentidão.
O Poder360 apurou que o mais lógico nessa situação teria sido transferir o processo para outra máquina da Oracle em nuvem. Essa possibilidade constava do serviço contratado pelo TSE, já que o contrato fala em “serviço de Cloud”. Em teoria, a nuvem seria criada em máquinas de dentro do TSE.
QUEM ERROU
Os equívocos foram observados em 3 níveis, do ponto de vista técnico, em novembro de 2020:
Oracle: a empresa demonstrou estar despreparada para a carga de dados recebidos. Com data marcada, a empresa deveria ter fornecido peças sobressalentes ou designado técnicos específicos para consertar eventuais falhas. O contrato firmado com a Justiça Eleitoral previa o fornecimento do serviço de “Advanced Customer Services: Workload Planning and Design, Consolidation Planning, Security Review and Recommendations” (na tradução: Serviços Avançados ao Cliente: Planejamento e Design de Carga de Trabalho, Consolidação, Planejamento, Revisões e Recomendações de Segurança);
Área técnica do TSE: aceitou contratar a multinacional dos EUA por R$ 26,2 milhões, mas não exigiu provas de que tudo estava com o dimensionamento apropriado;
Comando do TSE: o Tribunal não fez as perguntas certas internamente nos dias que antecederam a eleição.
Ao Poder360, em novembro de 2020, o TSE disse que os resultados eleitorais ficaram apenas no computador alugado da Oracle e dentro do datacenter da Justiça Eleitoral, mesmo durante a pane do dia do pleito (15.nov.2020).
A transmissão dos dados com os votos foi realizada por meio de uma rede criptografada limitada ao território brasileiro. Esse serviço é prestado pela empresa norte-americana Akamai. “Nós contratamos a Akamai, que tem nuvem no Brasil e no exterior para prestar o serviço de CDN, que é uma rede de distribuição de resultados”, explicou o tribunal. CDN é um serviço de fornecimento e entrega de conteúdos.
Fonte: Poder 360