Edgar Rocha
Bacharel em Comunicação Social (Jornalismo)_UFPI e graduado em Letras pela Universidade Federal do Piauí (UFPI). Pós-graduado em Comunicação e Linguagens (UFPI), com atuação na área de educação e no jornalismo impresso, on line, e no rádio. (86) 8836 6357 / 9966 9377
O retorno de Eliardo Cabral, o promotor das grandes causas no PI
Eliardo Cabral
foto: Edgar Rocha
Com muita garra e determinação, ele está de volta às atividades no Tribunal Popular do Júri, órgão responsável pelo julgamento dos crimes praticados contra a vida, representando o Ministério Público do Estado do Piauí na acusação dos réus. Falamos do destemido promotor de justiça José Eliardo de Sousa Cabral, de 57 anos, que voltou a atuar no julgamento de grandes causas no Tribunal do Júri de onde esteve afastado por seis anos.
O último dos polêmicos julgamentos foi o do ex-tenente Coronel da PM, José Viriato Correia Lima, acusado de ser o chefe do crime organizado do Piauí, no “caso dos queimados” que aconteceu no final do último mês de fevereiro. Acusado pelo Ministério Público, Correia Lima foi sentenciado pelo juiz a 47 anos e seis meses após ter sido considerado culpado pelo Conselho de Sentença.
Tribunal Popular do Júri
É bom lembrar que no Tribunal Popular do Júri quem condena não é o juiz nem o promotor de Justiça, mas o Conselho de Sentença composto por sete jurados, cidadãos de boa reputação previamente sorteados entre 32 escolhidos da sociedade. Os sete jurados votam secretamente dizendo ‘sim’ ou ‘não’, se o réu é culpado ou inocente. Essa decisão do jurado é tomada após ouvir os argumentos do Ministério Público, através do promotor de Justiça na acusação, assim como ouvir os argumentos dos advogados de defesa e acusação ou os defensores públicos no caso de o réu não ter advogado. Quem tiver os melhores argumentos em cima dos autos do processo é quem convence os jurados a condenar ou inocentar o réu. Nisso o promotor Eliardo Cabral é muito bom (grifo meu)
Ousadia e determinação no ofício
Polêmico, Eliardo Cabral é conhecido no meio jurídico e social por não ter “papas na língua”, por sua ousadia e obstinação em ir a fundo para colocar atrás das grades acusados de crimes dos mais variados quilates, independente de origem, poder econômico, classe social ou seja qual for o interesse. ”Caiu na rede é peixe”, como ele mesmo costuma dizer.
Professor de Direito, eloqüente e um dos mais atuantes promotores de Justiça do Piauí, da mesma geração do saudoso Afonso Gil Castelo Branco, o destemido promotor José Eliardo Cabral é um dos poucos que conversa com a imprensa e não tem medo de ir a público e denunciar figurões, seja ele do poder judiciário, do meio político ou um grande empresário do estado.
Odiado por muita gente
Por conta disso, ele diz ser odiado por muita gente e, ás vezes, rejeitado pelos próprios colegas de profissão por se sentirem incomodados pelo seu modo de trabalhar. Já recebeu inúmeras ameaças de morte e muitas intimidações por parte de pessoas incomodadas por seu julgamento no Tribunal Popular do Júri, por ter falado em corrupção, e por contrariar interesses. Muita gente já foi para a cadeia por conta de sua brilhante atuação na hora de convencer o Conselho de Sentença (Grupo de sete jurados escolhido entre cidadãos para condenar ou inocentar réus) do Tribunal Popular do Júri.
O preço do ofício
Segundo Eliardo Cabral, essa ousadia lhe custou muita dor de cabeça no decorrer dos últimos dez anos. Chegou a ter que se afastar do Tribunal do Júri e deixar de fazer uma das coisas que ele diz mais gostar, que é atuar no julgamento de criminosos, para trabalhar na Vara da família.
Segundo o promotor, ele esteve afastado do Tribunal Popular do Júri, não por imposição de ninguém, mas por vontade dele próprio após passar por um dos momentos de maior pressão da vida dele.
Episódio do Afastamento do Tribunal Popular do Júri
O fato aconteceu ainda em 2003, quando o Piauí vivia uma época sensível ao se falar em corrupção ou em pessoas importantes envolvidas em tal prática. Nesta época, o ‘coronelismo’ dos anos 60 e 70 ainda parecia imperar no Piauí e pouca gente se atrevia em falar nesse assunto. Ainda era recente o escândalo do crime organizado no Piauí onde o ex-tenente Coronel Correia Lima era acusado de ser o chefe. Falava-se, na época, em prefeitos corruptos envolvidos em esquemas de desvio de recursos públicos com a utilização de notas fiscais frias. Alguns deles foram intimados a prestarem esclarecimentos por ter comprado notas frias sobre pressão do grupo de Correia Lima.
Eliardo Cabral contou que, uma vez, quando ministrava duas disciplinas de Direito na Universidade Estadual do Piauí para um grupo de 80 alunos, no começo da década passada, no auge da empolgação dos seus ensinamentos e aconselhamentos aos futuros operadores do direto e sem a menor intenção de ofender ninguém, tocou em assuntos sensíveis e mexeu na ‘ferida’ de pessoas e de parentes de pessoas que ocupavam aquele espaço.
Segundo Eliardo Cabral, a turma era composta por alunos de vários segmentos sociais, mas ele não se deu conta disso. Ele citava exemplos e dava conselhos para que os futuros advogados não se desviassem de suas funções e não se envolvessem em corrupção. Pois para ele, o estado do Piauí tinha tudo para ser grande e desenvolvido, só estava faltando os homens daqui trabalhar corretamente e com honestidade.
Corrupção na política
Ao falar em política e ao mencionar corrupção neste meio, um aluno jovem prefeito de um município do interior do Piauí (não vamos citar o nome nem o município) levantou-se e disse: “ você poderia ser mais específico e dizer o nome de que tipo de político o senhor se refere? Destemido e determinado a falar o que pensava, Eliardo Cabral disse ter respondido: “... posso dizer sim, vai desde a câmara municipal até o palácio de Karnak”. O jovem prefeito respondeu: “... pois o senhor está errado porque um prefeito no interior funciona como pai e mãe da população”. Eliardo Cabral replicou: “...pois tá errado, prefeito não ficou para ser pai nem mãe do povo. Ele é eleito é para gerenciar o município, apresentar propostas e executar projetos em benefício do povo”, concluiu.
Corrupção no poder judiciário
Eliardo Cabral contou que quando mudou do assunto política para falar de Poder Judiciário e ‘tocou’ no tema corrupção, aí a coisa ficou mais feia. Ele começou fazendo elogios à atuação brilhante do Poder Judiciário piauiense assim como na excelência dos seus componentes. Mas quando no meio da conversa citou um provérbio popular que diz; “se no meio dos ovos houver apenas um deles estragado, todo o restante vai estragar o pudim”, referindo-se a corruptos no Poder Judiciário.
Segundo o promotor, neste momento um estudante levantou-se no meio dos demais e pediu para o promotor ser mais claro, assim como falara o jovem prefeito. Eliardo Cabral disse ter respondido o seguinte: “...vai desde a porta da delegacia até o Tribunal de Justiça”.
Ao falar isso, neste instante levantou-se uma estudante que não era ninguém menos do que a esposa de um dos membros da alta cúpula do Tribunal de Justiça do Estado, na época, (que não vamos citar função e nem nomes) e pediu que o promotor dissesse os nomes. Sem temer e com o mesmo ímpeto das respostas anteriores, Eliardo disse ter falado os dois nomes em claro e bom tom. Daí em diante ele contou que passou a viver os piores dias de sua vida.
Represália
O fato mexeu com a alta cúpula do Poder Judiciário do estado, e Eliardo Cabral disse ter enfrentado sete processos na Justiça sendo dois deles direto do TJ, sem nem mesmo passar nas mãos do seu chefe imediato, o procurador geral de Justiça. Os outros cinco tramitaram nas varas de primeira instância. Segundo o promotor, em um deles (Eliardo não explicou o tipo de ação, se por danos morais ou injúria e difamação) mas um juiz sentenciou-o a pagar R$ 50 mil. “Bloquearam minha conta bancária que, para minha sorte, só tinha R$ 300,00 porque a conta não pode ficar zerada, pois o que ganho não dá para guardar dinheiro e mal dá para cobrir as contas”, disse.
Afastamento e retorno
Após esse episódio ainda em 2003, a pedido dele mesmo, Cabral disse que optou a ser transferido para a comarca do município de União, a 36 quilômetros de Teresina, e por lá trabalhou por dois anos. Voltou em 2005 para trabalhar na Vara da Família em Teresina e só em outubro de 2009 voltou a atuar na Vara do Júri, mas na condição de não ser o titular porque tinha a certeza de que a partir do momento que contrariasse interesses iriam pedir seu afastamento.
Julgamentos e condenações em 22 anos de carreira
Aos 57 anos de idade e com 22 anos de carreira só no Ministério Púbico Estadual, descontando os anos em que atuou como advogado antes de prestar concurso para o MP, Eliardo Cabral disse que já atuou em 206 julgamentos no Tribunal Popular Júri com índice de condenação de 84,1%.
Evangélico há mais de 20 anos na Igreja Assembliéia de Deus, Eliardo Cabral se diz um homem 100% convertido nas coisas de Deus e hoje é dirigente no seu templo. Segundo ele, tudo que faz na sua vida faz de sã consciência de que tá fazendo a coisa certa.
Perguntei se havia algum conflito entre sua consciência religiosa e o fato de ter botado pessoas na prisão, Cabral respondeu que nem um pouco. " Existe a hora em que o homem tem que ser barrado pelos seus erros e por comenter coisas contrárias permitidas por Deus, até mesmo para ele cair na realidade e tentar dar novo rumo à sua vida, ou se arrepender de coisas ruíns que praticou, embora a prisão não conserte a maioria deles", completou.
Cabral contou um fato que aconteceu na cidade de Floriano, quando deparou-se dentro de uma loja de veículos com um ex-detento que ele (Eliardo Cabral) havia atuado na condenação. Em tom ameçador, o rapaz indagou se aquele era o homem que o tinha colocado na prisão e insistia em perguntar se aquele era mesmo o Eliardo Cabral. Irritado, o promotor disse que chamou o ex-detento para fora da loja para ajustar as contas se houvesse alguma. Só não foi às vias de fato porque foi separado pelo dono da loja que presenciara o eposódio.
Ele contou também que um fato inusitado aconteceu em sua vida. Assim como ja recebeu ameaças, ele também já recebeu o perdão de dois ex-condenados no caso do Donizeti Adalto. O dois, segundo o promotor, já covertidos na mesma igreja que ele (Eliardo Cabral), disseram que entendiam o promotor porque agiu daquela forma porque essa era sua profissão e não tinham rancor. Isso, segundo o promotor, maravilhou o seu coração porque estava diante de homens arrependidos.
Perguntei o que ele achava da religiosidade de Correia Lima que diz ser um homem evangélico. Cabral disse que duvida muito disso porque em nenhum momento Correia Lima assume seus erros. "Ele nega todos os crimes e está sendo condenados por todos. Um homem de Deus não mente e assume seus erros", compeltou.
Alguns julgamentos históricos na carreia
Dentre os julgamentos que ficaram na história, destacamos o de uma estudante (não vamos dizer o nome, pois já cumpriu pena ) que, com apenas 17 anos, ficou conhecida nacionalmente por ter matado o namorado com um tiro de pistola, dentro do apartamento, após uma discussão e ainda escondeu o cadáver por sete dias e tentou da fim ateando fogo. O namorado era policial Civil conhecido pelo apelido de “Charuto”, na época integrante de um grupo de elite da polícia Civil, o Comando Corisco.
A adolescente foi condenada por este crime pelo Tribunal Popular do Júri por duas vezes com a atuação de Eliardo Cabral na acusação representando o Ministério Público.
Eliardo Cabral também atuou no julgamento dos acusados da morte do jornalista Donizetti Adalto, em que os quatro acusados de executar o crime foram condenados a cumprir pena sendo que o mandante e um outro participante ainda faltam serem ulgados. (Aqui também não citamos nomes para evitar constrangimento)
Cabral atuou no julgamento de um advogado, acusado de mandar matar o prefeito de Porto, município localizado na região Norte do Estado e no julgamento de outro advogado famoso, crimes de grande repercussão no Piauí.
Depois aprofundaremos mais estes fatos....